terça-feira, 8 de agosto de 2017

Empreendedorismo no meio rural brasileiro

Cada vez mais ganham repercussão questões sobre o êxodo e o envelhecimento da população rural no Brasil. Os jovens rurais aprendem desde cedo, na escola e com suas famílias, que é na cidade grande que vão encontrar bons empregos, estrutura e as melhores oportunidades para melhorar as suas vidas. Essa é a trajetória esperada para um jovem de sucesso: deixar a sua comunidade e conseguir um emprego em uma grande cidade – Fortaleza, Recife, Salvador, São Paulo ou Rio de Janeiro.

O jovem rural se encontra diante de muitos desafios e incertezas entre “ficar ou sair” da sua comunidade. Entre as dificuldades de permanecer no meio rural há os limites impostos pela escassez da terra, da baixa renda das famílias e, consequentemente, de investimento na produção e acesso a crédito e tecnologias.

Em busca de um novo emprego, melhores salários, estudos e qualidade de vida, muitos jovens rurais brasileiros migram do campo para a cidade na tentativa de alterar suas vidas. Nos últimos 50 anos, o êxodo rural cresceu 45,3% no Brasil. Atualmente, a migração urbana também tem aumentado, mas não supera a evasão do campo. As conseqüências sociais decorrentes dos processos migratórios campo-cidade são inquestionáveis quando se observa, dentre outros, a favelização dos centros urbanos, aumento da criminalização e, em contrapartida, o esvaziamento do meio rural.

Entretanto, na região Nordeste do Brasil há muitos jovens que desejam permanecer em suas comunidades rurais. E buscam alternativas e estratégias para que possam ficar no meio rural e melhorar de vida. Um exemplo é a Adel, uma organização social fundada em 2007 por um grupo de jovens de comunidades rurais do Ceará, que tiveram a oportunidade de ingressar na universidade na capital do Estado. Depois de formados estes jovens retornaram para suas comunidades para investir seus conhecimentos e habilidades em prol do desenvolvimento local sustentável, através da formação e apoio técnico e gerencial a agricultores familiares e jovens empreendedores rurais.

A Adel está mostrando aos jovens rurais que é possível permanecer no campo através do empreendedorismo. Que há excelentes oportunidades de negócios, ainda não exploradas, no meio rural. E que é mais do que possível a convivência sustentável com a realidade local – a partir da potencialização dos recursos naturais e das vocações econômicas relativas a esse ambiente. A Adel está contribuindo para criar exemplos de jovens que ficaram e tiveram sucesso, aumentaram suas rendas e melhoraram suas vidas e de suas famílias – que agora estão sendo referências para outros jovens da região.

Sabemos que é um desafio trabalhar o empreendedorismo no sertão brasileiro em meio às adversidades climáticas e sociais, mas acreditamos que é possível transformar realidades através de conhecimento, incentivo, trabalho em rede e contribuição financeira e gerencial para impulsionar a implantação de uma ideia. As ações da Adel estão organizadas em quatro componentes, que representam as áreas prioritárias em que os jovens rurais e agricultores familiares precisam de maior acesso e apoio para que possam desenvolver suas iniciativas. Acesso a: (1) Conhecimento – formação de recursos humanos locais; (2) Crédito – para o desenvolvimento de negócios rurais; (3) Redes cooperativas – fortalecimento organizativo para governança local das comunidades e territórios; e (4) Tecnologias de informação e comunicação.

A permanência dos jovens no campo e sua inclusão socioprodutiva contribuem para a estruturação e para a agregação de valor das cadeias produtivas regionais – na medida em que os jovens aprendem e aplicam novas soluções e tecnologias e passam a ocupar estágios estratégicos nas cadeias, como de beneficiamento, processamento e comercialização. Os jovens estão mais antenados e próximos aos mercados e conseguem disseminar conhecimentos de modo mais efetivo que os agricultores tradicionais. Os jovens ainda difundem e aplicam técnicas de agricultura sustentável e agroecológica, com a utilização de técnicas menos agressivas em suas práticas produtivas e em seus negócios. A longo prazo, os impactos das ações da Adel incluem o fortalecimento da agricultura familiar, o aumento no nível de renda familiar e a difusão de um modelo sustentável de agricultura para comunidades rurais do Brasil.

Assim, a Adel acredita no jovem como um agente de transformação e de desenvolvimento sustentável. Uma geração de jovens mais comprometida em dar uma nova cara ao sertão brasileiro, às suas comunidades. Essa geração tem a maior escolaridade média da história da região e está mais sintonizada com o que está acontecendo ao seu redor, no mundo, do que nunca. É uma oportunidade para transformar a realidade social, econômica e ambiental do semiárido brasileiro.

De fato, disponibilizar aos jovens rurais um ambiente favorável à constituição da cidadania e condições de vida hábeis de agenciar a integração econômica e a emancipação social é crucial para que se consiga a permanência dos jovens no campo.  Não estou afirmando que os jovens devem permanecer no campo, afinal, eles são livres para escolher onde querem viver. O problema é com quais referências eles fazem as escolhas de “ficar ou sair”? Que percepções eles têm do meio rural? De seu lugar? E da sua família? Outra problemática a ser explorada, é de onde são herdadas suas percepções sobre o mundo rural. Atentando para estas questões poderemos ter resultados mais profundos sobre a problemática do êxodo das jovens, e talvez seja possível indicar alternativas para modificar esse cenário, como a Adel tem feito no sertão cearense.

+ Artigo originalmente publicado no site Mercado de Impacto.

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